Créditos da imagem: Old School Panini
Era opinião quase unânime: a Copa de 1986 consagraria o camisa 10 de uma seleção com a cor azul no uniforme. Mas seu nome, ao contrário do que possa parecer olhando de hoje, não era Diego. Michel Platini, astro da seleção francesa e da Juventus, era considerado o melhor jogador do mundo. Apenas uns poucos acreditavam que o argentino Maradona, então num Napoli ascendente, poderia tomar seu lugar. Mas 1985 não sugeria esta mudança. Campeão da Copa dos Campeões (antigo nome da Champions League, em formato bem mais enxuto) e do Mundial Interclubes, atuando pela seleção vencedora da Eurocopa, Platini era palpite seguro de entendidos como Pelé – ainda com fama de bom comentarista.
Outras seleções habitualmente favoritas não passavam pela confusão brasileira, porém não estavam em seus melhores dias. Após a semana mágica que a levou ao tricampeonato, a Itália voltou ao tradicional descrédito, com Paolo Rossi lesionado e em má fase. A Alemanha Ocidental, dirigida por Franz Beckenbauer, chegaria em processo de renovação e alguns poucos remanescentes do vice-campeonato de 1982. A Argentina, com o pragmatismo de Carlos Bilardo no lugar do estilo vistoso de Cesar Menotti, penara para se classificar e não teria o futebol de Daniel Passarella (supostamente vetado pelo desafeto Maradona). Nada otimista, a imprensa local não mandou muitos emissários. O bicampeão Uruguai, embora campeão da Copa América de 1983, nem havia se classificado para a Copa anterior e há muito deixava de figurar no rol de candidatos destacados.
No bloco dos azarões, a Bélgica despontava com uma geração bem menos decantada que a de hoje, mas muito competente – em especial o goleiraço Pfaff, do Bayen de Munique (que estragou a estreia argentina na Espanha). Falando nos espanhóis, os adversários da estreia brasileira haviam sido vice-campeões europeus e prometiam apagar a péssima exibição em sua própria casa. Para tanto, tinham o meia Michel e o centroavante Butragueño, titular do Real Madrid – em longo período de vacas magras internacionais. A seleção inglesa era outra que corria por fora com seu jogo aéreo, a experiência e Brian Robson e as finalizações de Gary Lineker. Havia também a Dinamarca, com uma geração que prometia surpreender com os craques Elkjaer e Laudrup. Por fim, os anfitriões ousavam sonhar com o companheiro de Butragueño e ídolo madrilista, Hugo Sanchez (ainda hoje tido como o melhor mexicano da História).
Vale destacar que os prognósticos, comparados a hoje, eram bastante prejudicados. Apenas o campeonato italiano era transmitido, mas com um único jogo televisionado por semana. Dificilmente alguém assistiria a mais de vinte jogos de Platini ou Maradona num ano. As Copas europeias eram mais seletas e nem mesmo a final era notícia – salvo na tragédia de Bruxelas, causada por torcedores do Liverpool minutos antes da decisão contra a Juventus. Para completar, apenas dois estrangeiros (incluindo origem europeia, pois os comunitários só surgiriam na década seguinte) podiam atuar por equipe, de modo que a maioria dos jogadores de cada seleção passava longe dos televisores do exterior. Tudo isso ampliava a curiosidade geral. Os elogiados realmente eram tudo isso? Quem seriam as surpresas? A Copa do Mundo, e só a Copa do Mundo, daria as respostas.
Outra diferença: como o calendário europeu tinha muito menos partidas, os atletas chegavam com desgaste menor em relação a hoje. Ao mesmo tempo, no Brasil os convocados ficavam um longo tempo sob a batuta da CBF e distantes dos jogos de quarta e domingo. Assim, todos os protagonistas chegavam ao Mundial em melhores condições físicas para desequilibrar individualmente. É a principal razão, a meu ver, pela qual é progressivamente improvável que um astro de clubes repita o desempenho por sua seleção. Pode ser campeão e jogar bem, desde que o coletivo ajude. Carregar um time nas costas ficou no passado, o que é uma pena. Quanto mais caminhos para a vitória, mais interessante fica um torneio. Como, de fato, a Copa de 1986 viria a ser das mais memoráveis, superando as expectativas – que já eram altas.
Como jogavam:
Michel Platini – o melhor jogador do mundo (até então) não rompia defesas com dribles. Seu forte era a visão de jogo com uma técnica primorosa. Tanto podia deixar os companheiros de cara com o gol, como chegava sorrateiramente para finalizar livre. Magistral pela Juventus e pela seleção.
Diego Armando Maradona – com qualidades técnicas já incontroversas, sua maior diferença para Platini era usar mais a condução de bola com sua perna esquerda envenenada. O que faltava, pelo Napoli e pela seleção, era vencer campeonatos.
Karl Heinz Rummenigge – um dos maiores atacantes de força da História, já tinha deixado o auge físico e chegou lesionado, mas nem por isso deixou de fazer parte da seleção em fase de mudanças.
Jean Marie Pfaff – primeiro de uma série de arqueiros lendários de seu país, o belga já chamara a atenção por suas defesas na Copa de 1982 – inclusive contra Maradona.
Elkjaer Larsen e Michael Laudrup – dupla dinâmica dinamarquesa. A força e velocidade de um (Elkjaer) era completada pelo repertório técnico de outro (Laudrup). Este último ainda atuaria por mais de dez anos por sua seleção.
Enzo Francescoli – já ídolo do River Plate, o uruguaio faria sua estreia em mundiais. Ponta-de-lança leve e técnico, contrastando com a cultura de “garra’ já levada ao exagero.
Hugo Sanchez – o mexicano não era um Cristiano Ronaldo, mas conquistou a torcida merengue com gols, velocidade e uma coleção de bicicletas que até o gajo aplaudiria.
Emílio Butragueño – companheiro de Sanchez no Real Madrid, não tinha as virtudes deste último, mas poderia surpreender numa jornada inspirada – como de fato faria.
Leia também:
– A Copa que eu lembro – 1986 – Parte 1
– A Copa que eu lembro – 1986 – Parte 3 (da superação às lágrimas, em quinhentos minutos)
– A Copa que eu lembro – 1986 – Parte 4 (se Deus é brasileiro, deu uma “mano” ao vizinho…)
Adoro quando mostram como as coisas eram na época, em vez de contar a história de frente pra trás!!!!! Parabéns, era isso mesmo!!!!!!!!! E hoje quase ninguém mais fala do Platini, que jogava demais e foi regular em boa parte da carreira, ao contrário do genial e instável argentino!!!!!!!!!
ótima coluna
Apesar de Platini ter sido um grande jogador, não dá nem pra comparar.
Se a França tivesse vencido em 1986, o que as pessoas falam hoje do Maradona falariam era do Platini.
Maradona the best of the best
Jogava muito mais o Maradona era melhor
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[…] Continua na parte 2. […]
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