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Para fugir do blá, blá, blá de hoje em Brasília, falemos dos tempos da São Paulo da garoa, das noites frias, agitadas e elegantes.
É que cruzei a Ipiranga com a São João muito antes de Caetano chegar por aqui, de ouvir Rita Lee, quando a rádio Pan-americana era a emissora dos esportes.
Garotão, frequentava o elegante Restaurante Brahma uma vez por mês, levado por Ernesto Troncon, campeão de vendas na Alto Araraquarense, para quem creditasse direitinho suas comissões. Eram deliciosas as azeitonas pretas do tamanho de bola de ping-pong, e o queijo gorgonzola, italiano, sabendo que as varejeiras eram para ele.
Os frequentadores do Jeca, na esquina oposta, eram, isso sim, chiques. Seus lanches eram disputados na madrugada, até as 5 da manhã, quando os fregueses iam para a calçada, para que os empregados fizessem a limpeza e o cardápio era trocado pelo fortalecido café da manhã. Os boêmios iam descansar…
Os lanches rápidos, eram por conta da Salada Paulista, ao lado esquerdo do Cine Ipiranga. Um longo balcão em forma de ferradura. Salsicha com salada de batata e refrigerante. Os garçons anotavam o pedido no mármore branco do balcão, apagando após o pagamento. De quando em quando, limpavam o local com álcool.
Mulheres e homens elegantemente vestidos desfilavam pela passarela formada pela Barão de Itapetininga, Ipiranga, São João e Dom José de barros, onde o Pinheiros mantinha sua sede na cidade.
Quando o grande zagueiro Mauro Ramos de Oliveira passava, vestindo Minelli, o alfaiate dos poderosos, as mulher suspiravam – algumas assobiavam. Sem a mesma elegância, Canhoteiro, ponta do São Paulo, e Idário, do Corinthians, seu implacável marcador nos campos, detonavam chopps e baurus no subsolo do Ponto Chic, no Largo do Paissandú.
Quase na esquina, na São João, tinha o 518, ponto de encontro dos artistas circenses nas segundas-feiras à tarde/noite. Ali aprendi com um garçom gente boa, nunca pedir o sanduíche “no capricho”. O cozinheiro podia estar de mau humor e sapecar belas cusparadas antes de jogar o presunto na chapa quente.
Caetano talvez não tenha experimentado a sopa do Gouveia, disputadíssima depois das 3 da madrugada, revigorante, verdadeira “levanta defunto”. Nem o Avenida Danças, com suas bailarinas perfumadas, “brincos iguais ao colar, e a ponta de um torturante…”. E os pés-de-valsa, “agás” e lagartixas, categorias bem definidas. A presença dos lagartixas aumentava nas férias escolares, quando as esposas iam para o litoral com os filhos e os maridos permaneciam trabalhando – afinal, nunca ninguém foi de ferro.
Foi ali ou em algum outro lugar de diversão e sedução, que nasceu um dos sucessos de Ângela Maria: “quem descerrar a cortina, da vida da bailarina, há de ver cheio de horror, que, no fundo do seu peito, guarda ela um sonho desfeito, uma desgraça no amor. Fingindo sempre que gosta, de passar a noite exposta, sem escolher o seu par…”.
Espetacular!
Jogando pelo São Paulo, num lance de bola alta, Mauro caiu sobre a perna de Vasconcellos, titular da meia esquerda do Santos. Com a perna quebrada, Vasconcelos deu chance ao aparecimento de Pelé, garoto franzino iniciando na Vila. Não tivesse ocorrido e talvez Pelé esperasse mais tempo para ser lançado, não teria ido à Copa de 58….
MARAVILHA DE CRÔNICA…
APENAS UMA OBSERVAÇÃO. OS TERNOS DO MAURO, EU ACHO, ERAM DO LAMBACK, ALFAIATE DA GALERIA GUATAPARÁ, CONFORME RELATO NA MINHA CRONICA POSTADA NO FACEBOOK. ABS
Obrigado tão, pela presença. absss
Com tantas baboseiras sendo ditas pelas bandas de Brasília, só mesmo uma crônica desse tipo para refrescar a nossa mente. Excelente!
Obrigadão…rsss
De primeira mesmo!
Entrevistei Idário e ele contou que fazia um trato com Canhoteiro. Em cada quatro lances, me deixe tomar uma, que não te jogo no alambrado…rsss Amigos
Que delícia de texto, José Aquino!
Sou apaixonado pela história de São Paulo, e meu pai sempre me conta histórias dessa região, já posteriores. Do Salada Paulista, da Paribar, da “Prainha” entre o Ipiranga e o Marabá… eu ainda não tinha ideia de que a antiga sede do Pinheiros ficava lá!
Lamento por algumas coisas terem tomando o rumo que tomaram. O de a nossa sociedade ter ficado mais violenta, a ponto de ter sido perdido muito do romantismo da boêmia. De nossas torcidas terem sido barbarizadas, a ponto de jogadores não poderem ficar acessíveis aos torcedores insuportáveis. E de os famosos em geral terem se tornado “celebridades”, isso em quase todo o mundo, de modo que vivem em outra dimensão, na qual não convivem com os “reles mortais”..
Verdade, essa época devia ser muito gostosa de se interagir com os jogadores… Eles eram “gente como a gente”… Saudade do que nunca vivi! Hehehe
Paribar, atrás da biblioteca, ponto elegante ao cair da tarde. Para executivos da Sete de Abril e Marconi. À noite era para os boêmios. Tentaram revivê-la há pouco tempo, mas a violência mete medo.
Uma noite, Fernando, início da década de 1970, indo para casa, na Vila Olímpia, passei antes na Clodomiro Amazonas, onde tinha o Rei da Batida, para comprar umas coisinhas e levar para casa. Quando estava saindo, estava estacionando um carro com Edu, do Santos, e mais três. Fui cumprimenta-los e ele disse: “Puxa, até aqui vocês nos perseguem”. Respondi que aquele era meu pedaço…Eles entraram no carro e um deles disse, vamos para Interlagos. Quer dizer, saiam de Santos para zoar aqui…rssss