Eu admito que por algumas semanas fui dos que duvidam do sucesso imediato do Neymar no Barcelona. Pensava que o clube precisaria vencer a era da ideologia atual e respeitar o brasileiro nas suas qualidades originais pra que ele desse certo. Ou seja, encerrar o ciclo vencedor atual e iniciar um novo, adaptado ao craque. Bobagem.
Neymar é um gênio da bola. Eu não tenho idade suficiente pra ter visto Pelé ou Zico jogarem, mas acompanhei Ronaldo, Romário, Ronaldinho, Kaká, Robinho e outros menos cotados – mais cotados quando começaram a carreira -, como Denilson ou Pato. Digo com a convicção aumentada com o meu envelhecimento (lado bom disso) que o Neymar é a maior revelação dos últimos 30 anos do futebol. Supera inclusive o fenômeno Ronaldo, que ganhou as principais manchetes do mundo com menos de 20 anos. Supera porque não é apenas um centroavante espetacular. Joga em qualquer posição da faixa ofensiva do campo, sem prejuízos. Poderia ser centroavante, sim. Sabe se posicionar, cabecear, achar a brecha pra concluir. Mas prefere ser segundo atacante, porque ali tem mais oportunidades de jogar e desfilar seu infinito cartel de efeitos mágicos com a bola. Do ponto de vista moral, já passou até no teste de guerra “Libertadores”, aquele tão exigido para os jogadores que pleiteiam ser considerados completos.
Por isso, Neymar não precisa que o Barcelona se adapte a ele. Ele mesmo vai se adaptar rapidinho ao Barcelona. Gênios são assim. Encaixam em qualquer lugar. Não “deram sorte”. Fizeram sua própria sorte. O garoto chegou no clube catalão com o discurso perfeito: não quer roubar os holofotes, nem da mídia, nem táticos, do astro Lionel Messi. E parece entender o discurso. Não se trata apenas de repetição decorada.
Adaptar-se às circunstâncias é o beabá do sucesso: a sua reputação é muito importante num ambiente coletivo; se o grupo não o respeitar, você não chega a lugar nenhum. Da mesma forma, se uma comunidade não aceitar o indivíduo, seu talento ficará oculto, incapaz de transcender do campo das potencialidades para a realidade. E Neymar entende isso. Porque é gênio.
Muitos alegavam que um malandrinho brasileiro teria muito o que aprender ao chegar na Espanha. Pois cravo: ele não é um malandrinho brasileiro. Neymar é mais que isso. Parece um moleque, mas é um homem feito. Desses que ainda são jovens e usam penduricalhos e se enchem de tatuagens, mas que são donos da palavra final sobre o que vai ser feito da sua vida. Ele quis jogar no Barcelona. Sabia que lá era o seu habitat natural, o campo dos sonhos de um jogador fadado a criar, não só pro seu time numa partida decisiva, mas pro futebol mundial. Pro imaginário dos amantes do esporte.
Mas o Neymar não é só sonho. Ele sabe aonde pisa. Aos 21 anos, tem uma gama espantosa de informações sobre quais são as regras de outro planeta. E vai cumpri-las, pois é gênio. Sem perder as suas qualidades. Saberá se colocar ao natural, sem forçar. Já começou. Entrou numa partida decisiva, a primeira do Barça com a sua presença, e foi decisivo. Enquanto os outros comportados e bem treinados espanhóis agonizavam pra superar uma marcação experiente e matuta, o garoto entrou e não venceu a defesa do Atletico Madrid a dribles, como seria de se imaginar para um “malandrinho brasileiro”. Não. Fez o simples no clássico Vicente Calderón.
Neymar fez o simples. Porque gênios são feitos disso também: saber fazer o simples quando o que importa é o resultado. Saber entender o contexto. Se colocar no lugar certo na hora certa. Foi lá e cabeceou pra empatar. Vai entrar no time titular fazendo o simples. Vai esperar o Messi admitir que o ciclo dele no Barça passou. E vai ganhar o time. Tem tempo pra isso.
O moleque da baixada santista vai chegar lá. Quando, eu não sei. Mas vai. Ele tem todas as ferramentas necessárias pra isso. Inclusive fazer os outros acreditarem que ele não passa de um malandrinho brasileiro, e poder ir comendo pelas beiradas.
Neymar é mais que um jogador. Por isso decidiu ir praquele que é considerado mais que um clube. Eu jogo minhas fichas nele. Alguém arrisca?