Créditos da imagem: futebolinterior.com.br
Fica difícil lembrar como tudo começou dentro de campo, mas acho que já faz um bom par de anos. Lembram dos atletas de Cristo? Parecia algo midiático e passageiro, aquela coisa toda de se abraçar em campo e antes, rezar no vestiário.
Antes que comecem a me crucificar enfatizo que o assunto é futebol e não religião. Então, cada macaco no seu galho. No campo jogamos futebol e na sinagoga, no terreiro, na mesquita ou na igreja, oramos e mostramos a nossa fé e o quanto somos pecadores, generosos ou desprezíveis.
Acho que muita gente no começo até achou bacana, pois ao contrário do atleta festeiro e boêmio surgia seu antípoda, o Atleta de Cristo, cheio de bons modos e intenções, dentro e fora de campo.
Lá atrás, no mundo de antigamente, os saltos quase ornamentais e depois as dancinhas e outras criatividades típicas brasileiras inundavam o campo na comemoração do gol, mas nunca, creio eu, ao ponto de competir com o gesto emblemático de Pelé, que ao saltar colocava o punho direito cerrado e socando o ar sobre sua cabeça. Muito imitado, mas nunca igualado.
Depois, pode-se perceber que nas entrevistas a referência eram chavões seguidos de “graças à Deus”, “foi Deus que quis”, “tenho fé”, “estamos com Cristo”, etc.
Teve também o maior e mais icônico garoto propaganda da fé evangélica encarnada no jogador Kaká, que chegou a doar a taça que recebeu como melhor jogador do mundo para a igreja que frequentava e defendia, apesar de todas as críticas e notícias que vinculavam dirigentes com dólares não declaradas nos States. Por ocasião do seu rompimento com a Igreja Renascer em 2010, acabou pedindo o troféu de volta – que não sei se entregaram.
Um exemplo bem feio para seus fiéis eu diria. Foram anos de demonstração de fé pública do jogador até o rompimento com a igreja.
Mas confesso que fui surpreendida e acho que nada iguala a imagem recente de jogadores do Santos ajoelhados no gramado, com seus uniformes brancos com ambos os braços levantados para o alto como em uma prece, e com o indicador apontando para o céu durante partida do Campeonato Paulista.
O tema não é novo e há alguns anos rendeu um embate público entre Juca Kfouri e o próprio Kaká, que se sentia perseguido pelas críticas ácidas do jornalista, ateu assumidíssimo.
Mas a situação fugiu ao controle e a FIFA se viu forçada a intervir, e proibiu manifestações religiosas coletivas em campo depois que a Seleção Brasileira rezou no gramado do Ellis Park, ao final das Copas das Confederações, em 2009. Exemplos de fervor religioso em campo não faltam.
Segundo o artigo “A relação entre o futebol e religião no Brasil”, da jornalista Leidiane Vieira dos Reis, publicado no site Universidade do Futebol, em 2013, “para muitos jogadores a religião é um meio de encontrarem força para suportar a grande pressão que enfrentam em seu dia a dia e também para se consolarem no momento da derrota. Muitos desses atletas se utilizam da fé para conquistarem seus objetivos profissionais, acreditam que são guiados por Deus e que por isso vão ser capazes de se tornarem campeões”.
Posto dessa forma, fica bem compreensível essas atitudes em um universo complexo e envolto em paixões. Mas na minha leiga opinião, o campo ou outro local onde se pratiquem esportes, já que o tema aqui é esse, não deveria ser o palco para manifestações religiosas. E nesse aspecto, creio, os dirigentes dos clubes e das Confederações são muito condescendentes com manifestações pelo que se tem observado em campo e nas entrevistas dos jogadores.
Até porque se reza ganhasse jogo o Brasil não tinha levado os 7×1 da Alemanha já que tinha crente às pampas (aos montes).
Mas claro que não é só no esporte que a religião se imiscui de forma cada vez constante. A todo momento surgem proposições absurdas misturando Estado e religião.
No Rio Grande do Sul, a deputada Liziane Bayer, do PSB, a mesma que quis colocar nas escolas (públicas e privadas) do estado o ensino do criacionismo (PL 124/2015), quer instituir o Dia Estadual da Marcha Para Jesus no calendário oficial do Estado (PL100/2015).
Por favor, assessores, alguém tem que avisar a digníssima deputada que vivemos em um Estado LAICO.
Se uma deputada que deveria levar em conta a Constituição (e dar exemplo de sensatez) faz esse papelão, o que esperar dos jogadores que acham normal expressar sua crença ajoelhados em frente às câmaras de televisão? Imagine Deus tendo que decidir para qual time torcer se houver discípulos em todos os times…
Quem sabe em vez dessas demonstrações públicas (e desnecessárias) de fervor religioso, nossos atletas não deveriam investir em projetos sociais ou retribuir um pouco do que conquistaram em investimentos de apoio ao esporte nas comunidades de onde vieram?