Créditos da imagem: ESPN Brasil
Final do campeonato paulista de 1987. A transmissão era da Bandeirantes, mas (como diria o locutor da concorrente) o Corinthians parecia ser Brasil no Paulistão, tal o inconformismo nos gols tricolores. “Viu, não marcaram o Silas, o Müller, etc…?”. Mas não foi só isso. Antes mesmo de começar o jogo, o assunto era apenas o que o Corinthians tinha que fazer para ser campeão. É claro que a torcida são-paulina se irritou e muitos preferiram a Globo na segunda partida. É mais claro ainda que torcedores seguem se irritando quando jornalistas torcem descaradamente enquanto trabalham. A pergunta é: por que jogadores e técnicos também, como fez Vagner Mancini, não podem se dar o direito de ficar de saco cheio?
O Vitória, clube na zona de rebaixamento, havia acabado de surpreender o líder invicto em seu estádio. Qualquer treinador iria à entrevista animado com seu trabalho e o resultado positivo. Eis que surge um início de pergunta anunciando mais uma reprimenda que uma indagação. Só restaria ao técnico admitir que o triunfo foi acidental e, quem sabe, pedir desculpas à nação corintiana pelos infames três pontos. Isso contra uma equipe que, segundo um conhecido comentarista, pode enfrentar o Real Madrid de igual pra igual. Foi perfeitamente compreensível a resposta irada, seguida pelo fim abrupto da entrevista. Primeiro faltou respeito na pergunta. Depois sobrou corporativismo na solidariedade ao jornalista.
Mancini, enfim, capitulou. Ainda mais depois que um traíra de rede social privativa revelou que se referiu ao repórter como “babaca”. Prevaleceu o instinto de sobrevivência. Há catorze anos, um mês antes de Kaká se transferir para o Milan, o jogador deu uma resposta educada, porém cortante, dizendo que só iria falar sobre futebol no Brasil. Testemunhei a rodinha de repórteres que se formou quando o jogador foi ao vestiário. O recalque foi tanto que, no dia seguinte, teve matéria no JT destacando sua péssima atuação no coletivo de vinte minutos. Quantas vezes se vê análises individuais em treinos? Pois é… Mas Mancini não é Kaká. Não tem um time italiano prestes a contratá-lo. Não pode desafiar sozinho uma corporação.
Jornalistas esportivos estão sempre à vontade para criticar, mesmo que muitos não saibam nada do assunto. A pretensão nem se resume ao futebol. Já houve até um apresentador dizendo que o tenista Rafael Nadal não seria bom na grama, pois “só” ganhou duas vezes o torneio de Wimbledon. Tal conforto é inversamente proporcional ao que ocorre quando são criticados por quem não é da imprensa. A consternação é tão grande que até inimigos mortais se abraçam na defesa da classe. O que seria mais cômico, não fosse mais trágico, é que ontem mesmo um deles criticou o corporativismo dos técnicos em reunião com a CBF. Só vale quando é o deles. E como vale.
Não vejo problemas em assumir que torce para um time. Também não se deve confundir toda defesa de carreira com corporativismo. Muitas carreiras são alvo de distorções que exigem a união de membros. Mas isso não dá a ninguém, incluindo o jornalismo, a obrigação de pegar em armas contra toda e qualquer fala, mesmo que áspera. Não existe lei determinando que opiniões só podem ser dadas em estado de plena serenidade. Há momentos em que a melhor crítica é precisamente a dita com ânimo exaltado, para ressaltar a indignação. Uma carreira que se agiganta em face de uma opinião contrária plausível, ainda que grosseira, não está fazendo nada além de se apequenar.
Antes de tudo, obrigado pelo seu texto, Gustavo.
Bom, de cara já adianto que não concordo com a sua alegação de corporativismo, embora um ou outro jornalista de fato tenha tentado desclassificar Mancini chamando-o de “técnico de clube pequeno etc e tal”, como se isso – que nem é verdade – tivesse alguma coisa a ver com o ocorrido.
No entanto, muitos “não jornalistas” também assim o fizeram.
Vejo a situação da seguinte maneira: o repórter retratou o jogo falando coisas que não eram condizentes com os acontecimentos da partida – fato – e o Mancini, muito provavelmente frustrado por não sentir o seu trabalho reconhecido, exagerou, perdeu a mão (e a razão) ao indagar de forma rasteira se o repórter era corintiano. Foi impulsivo e inconsequente, mesmo com a ressalva de que pudesse estar nervoso. Tivesse agido com elegância e se restringido aos argumentos sobre a partida, teria dado uma boa lição para o rapaz sem a necessidade de toda essa exposição.
Sobre o áudio “muy amigo” vazado também acho sacanagem comentar…
Mas o que mais chama a minha atenção nisso tudo é a percepção de que muitas pessoas LAVARAM A ALMA com as palavras do treinador. Explico: sabe aquele papo chato de botequim de que “a Globo é contra o meu time”, “Contra tudo e contra todos” e todo aquele blá-blá-blá?! Pois então, reputo boa parte desse apoio em massa ao Mancini a esse tipo de torcedor, que só sabe olhar para o próprio time e umbigo e não entende que o futebol também é um negócio (de maneira que é natural um Flamengo e um Corinthians, times destacadamente mais populares do País, tenham mais espaço na programação do que os demais).
São torcedores mimados e que viram na figura de Mancini um “legitimador”.
Ainda bem que o técnico voltou atrás (concordo que em parte por instinto de sobrevivência, mas gosto de pensar que também por grandeza, principalmente em consideração à carreira do jovem repórter) e acabou por dar uma desmoralizada nessa turma.
É a minha opinião. 😉
E segue o jogo.
Fernando, há manifestações de torcedores mimados, mas há também constatações óbvias. Os exemplos que dei são todos verídicos. O que a Bandeirantes fez em 1987 foi tão escandaloso que chamou a atenção, num tempo em que não havia internet para espalhar fatos. O incidente com Kaká eu vi e ouvi de perto, na única vez que assisti a um treino do time. Foi nojento. Repare que não dou os nomes dos envolvidos para evitar maiores celeumas, mas eram pessoas de mídias valiosas.
No caso em tela, volto a dizer que aquilo não era uma pergunta. Foi uma acusação. Da mesma forma que, quando querem adular, muitos repórteres fazem perguntas tão enaltecedoras que a melhor resposta seria “pois é, eu sou f… mesmo”. Considero o nível geral dos jornalistas esportivos baixíssimos. Normalmente fazem observações táticas de dois anos antes. Falam em “dupla de ataque” de time que joga no 4-3-3. Se um time usa 3 zagueiros, já chamam o esquema de 3-5-2 sem entender que agora se utiliza o 3-4-3. Falta estudo. Falta vontade de estudar. Mais que isso: falta sentir necessidade da vontade de estudar.
Vou dar outro exemplo por meio de uma ótima exceção. Tim Vickery, jornalista inglês radicado no Brasil, falou com total aspereza quando jornalistas brasileiros, incluindo colegas do SporTV, colocaram David Luiz na seleção da Copa. Ele viu o que os ufanistas e desavisados, mesmo sob efeito do 7 a 1, insistiam em negar. O zagueiro, com seu posicionamento de pelada, foi um dos responsáveis pelas derrotas. Tostão é outro que foge à regra. O fato de ter sido boleiro não o faz se sentir dispensado de estudar e, não raro, rever conceitos.
Não subestime os críticos dos jornalistas. Muitos que apoiaram Mancini estão longe de exigir que jornalista esportivo puxe a brasa pro seu time. Olhe e ouça ao redor.
Saudações.
Respondi ao contraponto, que a meu ver se equivoca ao qualificar como mimados os torcedores que apoiaram Mancini. Não que parte deles não seja, mas há opiniões muito válidas que acabam sendo colocada na vala comum.
O jornalista era corintiano mesmo( conforme visto em suas redes sociais). Não foi uma pergunta, foi uma afirmação com informações mentirosas e tendênciosas a favor de seu time de coração. Mancini na minha opinião foi até educado demais.
E sinceramente, tenho vários amigos corintianos que também seguem minha opinião.
No mínimo, no mínimo mesmo, o repórter ( se é que o mesmo deve ser chamado disso depois deste episódio) deveria ser imparcial e ele passou longe disso .
Discordo do título do artigo: Deveria constar “Vagner Mancini, um pigmeu entre os homens”.
Dito isto, entendo que a atitude do técnico, intempestiva, teve efeito único de tirar todo o mérito da grande vitória que o mesmo conseguiu, desafiando as chances, frente ao líder invicto do campeonato. De quebra, como colateral, fechou as portas para que o mesmo possa, um dia, trabalhar em um dos maiores clubes do país e, quiçá, no maior centro futebolístico da nação (o estado de São Paulo).
Uma pessoa sábia deve, ainda que em uma situação difícil, sair com classe.
Mancini não é sábio. Longe disso. Não conseguiu, sequer, capitular um breve átimo do bom vento que soprava a seu favor… Colocou tudo por terra.
Saiu de São Paulo, mais baixo do que chegou, pior do que se o seu time tivesse sido goleado…
Não sou jornalista. Não trabalho com mídia. No entanto, qualquer pessoa que sobe a um púlpito para dar uma “coletiva” deve ter um mínimo de treinamento e preparação, do contrário, as palavras podem macular, inclusive, o seu desempenho profissional, uma vez que, em meio às paixões humanas, se mistura, muitas vezes, bom desempenho profissional com simpatia e cortesia.
Mas o técnico não é reconhecido pela competência, também. Conseguiu um feito raro, inédito no Brasileirão, mas que provavelmente será esquecido ao final do ano, uma vez que o clube derrotado erguerá a taça, enquanto o técnico intempestivo terá sido rebaixado com o Vitória.
No entanto, independentemente do derradeiro encerramento, Mancini poderia ter desfrutado com glória o seu momento de calmaria em meio à tempestade. Não pode, contudo, devido a sua falta de sobriedade, aliada a um evidente complexo de vira-lata.
Para vocês curintianus pode ser esta sua opinião, mais o Macini não saiu mais baixo do que chegou em São Paulo, ele saiu como um gigante por quebrar a invencibilidade do Small club
Precisa aprender a escrever, antes de se aventurar a comentar na internet, sra. Derci.
Se denomina “corintiano” o torcedor do maior clube do Brasil.
Quanto ao “gigante”, espero, sinceramente, que ele consiga trabalho no seu time; no meu, nunca! Amém!
Saudações!
Gustavo Fernandes, adorei seu artigo e ainda mais sua resposta aos defensores de jornalistas imparciais, Parabéns
Texto muito bom, mas ainda assim tenho ressalvas em relação à fala do Mancini. A média do jornalismo esportivo praticado no Brasil Beira o amadorismo. O que acho, porém, é que ele perdeu uma grande oportunidade ao levar a discussão para o seu lado mais pobre. Afirmar que fulano é corintiano ou coisa que o valha é um direito (sagrado por sinal ) do torcedor comum, mas é irresponsabilidade quando parte de um profissional. Ha muito o que se melhorar, só não acho que Mancini tenha contribuído para isso.
Mas ele é corinthiano mesmo
Excelente texto, Gustavo Fernandes!!! Concordo com o Fernando Prado e o Matheus Aquino que o Mancini errou feio ao acusar o repórter de corintiano e ao “jogar para a galera” quando veio com aquele papo da mídia paulista não reconhecer coisas boas no resto do Brasil e blá blá blá.
Mas estou totalmente de acordo com você sobre o corporativismo da imprensa esportivo, e dou total razão ao Mancini por se irritar e confrontar abertamente o repórter. Aliás, a cobertura esportiva comumente é um tristeza, não só pelo nível de muitos profissionais, mas também pelas escolhas feitas: tratar todas as notícias como se fossem para os torcedores dos clubes (e não para interessados em futebol), sempre como uma coisa voltada para os jovens, bem fanfarrona…
A conversa sobre a mídia paulista realmente extrapolou, mas aí é aquela coisa de querer racionalizar a raiva. O que, aliás, começou o episódio, já que visivelmente a pergunta do repórter estava querendo racionalizar seu inconformismo com o suposto antijogo do Vitória.
Pra mim o Mancini teve toso direito de se irritar, aliás até de forma educada não vo ser leviano a ponto de dizer que o reporte agiu de má fé na pergunta, mas a mídia puxa muito o saco sim pra os times Paulista a bandeirante então nem se fala…
Mas esse corintianismo dos jornalistas dá nojo mesmo. Nunca é o adversário que vence, mas o Corinthians que perde. É triste.