Créditos da imagem: Ernesto Benavides / AFP
Reflexões após testemunhar o triunfo do inacreditável
Consta que Sepp Herberger, técnico da Alemanha Ocidental que assombrou o mundo ao bater a favoritíssima Hungria em 1954, dizia “a bola é redonda, o jogo tem 90 minutos e tudo o mais é teoria”. Aquele foi o Milagre de Berna. Neste sábado, vimos a máxima de Herberger se concretizar no Milagre de Lima. Esqueçam o que foi previsto antes de o jogo começar. Esqueçam as explicações sobre os primeiros 87 minutos. Só restaram 2 do tempo regulamentar e mais 2 dos acréscimos. É o que entra para a História. O resto só será lembrado para realçar o que importa.
No choque entre dois times estranhos entre si, pois nunca haviam se enfrentado (não com Jorge Jesus no comando rubro-negro), muitos analistas esperavam que o River Plate sentiria mais o primeiro encontro. Como ocorreu com o Grêmio em Porto Alegre. Mas foi o Flamengo que ficou desconfortável com a correria compacta do River Plate. Como isso se deu? Difícil entender. Acredito que a parte física influenciou. O Flamengo em fim de temporada. O River Plate em meio de temporada. O Flamengo jogando quarta e domingo para encerrar a disputa do título nacional. O River Plate podendo descansar mais. Foi assim que os comandados de Gallardo puderam incomodar os de Jesus, antes e depois do gol. Restava saber por quanto tempo isso duraria. Durou o primeiro tempo todo. E boa parte do segundo. A ponto de o rubro-negro esperar o gol de misericórdia em forma de tango argentino.
Quando os argentinos deram sinais de cansaço, o Flamengo já estava em pré-desespero, agravado pela lesão de Gerson – encaixotado pelo meio-campo rival. Diego, que mal jogara depois da longa recuperação, virou a alternativa. Contando também com os espaços que começavam a ser dados, colocou a bola no chão. Mas os minutos passavam e Jesus arriscou ainda mais com Vitinho, o que deixou o camisa 10 ex-santista como o único meio-campista da equipe. São aquelas loucuras que precisam ser combinadas com o adversário. Gallardo, pasme-se, topou. Especialmente quando seguiu o exemplo de Jesus e optou pela experiência de Pratto nos minutos finais. Foi Pratto, e não Diego, que iniciou o contragolpe redentor. Foi Bruno Henrique o primeiro a sair do estado de choque. Depois Arrascaeta. Depois Gabigol. 1 a 1. Prorrogação à vista. Melhor para quem? Eis a resposta que nunca teremos.
Em tese, o Flamengo estava mais inteiro. Taticamente, porém, o River Plate estava mais equilibrado. O máximo que Jesus poderia fazer era colocar Piris da Motta, saindo do modo suicida. Se a teoria pró-Flamengo antes do início do jogo virou pó, a melhor prática recomendava aproveitar o clima e acelerar nos descontos. Diego deu um meio-chutão, meio-lançamento para Gabigol e Bruno Henrique se virarem. Gabigol, que passou 99 % do jogo no bolso do esforçado Pinola. Mas é como se diz no tênis: bola 99 % fora é dentro. O 1 % de pânico do zagueiro milionário entrou para o registro do lance que selou a partida, aos 92 minutos. Seria preciso mais um tempinho para finalmente alguma teoria se confirmar: Gabigol realmente foi expulso após confusão. Mas de nada adiantou. Sorte apenas do primeiro adversário rubro-negro na Libertadores de 2020. Isso se Gabigol estiver lá.
Difícil tirar conclusões de um evento desses. Mas ouso tentar algumas:
1 – mal-acostumado ao ritmo sonolento das vítimas brasileiras, o Flamengo sentiu falta de um sparring nos moldes do River Plate, já que não enfrentou nenhum clube argentino sob a batuta do técnico lusitano;
2 – a dificuldade rubro-negra evidencia o quanto falta para transformar o padrão europeu em nível europeu, pois do contrário não teria sentido tanto os efeitos do ritmo intenso, porém centrado em muita correria (daí o desgaste), do River Plate;
3 – se tivesse um terceiro meio-campista centralizado melhor que Piris da Motta, possivelmente as complicações seriam menores, pois Gerson ficou sozinho quando Arão foi recuado para ajudar na saída de bola;
4 – mesmo sem este jogador natural, é altamente recomendável que o Flamengo tente preparar alguém para a função (seja Piris ou Everton Ribeiro devidamente treinado para tanto) se enfrentar o Liverpool – ao menos se não quiser levar uma surra, pois o time inglês não precisa correr tanto para obter ainda mais intensidade e compactação;
5 – Bruno Henrique é, definitivamente, um fora-de-série quase tardio, mas que explodiu em ótima hora para o reinado da Gávea.
É o que ouso falar sobre o que vi. E é o que, em questão de dias, pode ser apenas mais teoria no universo da bola redonda e seus 90 (+4) minutos. No mais, parabéns ao Flamengo pelo título e pelo que fez pelo futebol brasileiro, no que prometia ser mais um ano abaixo de medíocre. Durma com essa, Mano! Ou melhor: não durma.
Eu concordo com a sua analise porém acredito q o que gerou o mal desempenho do Fla foi a forma com que alguns jogadores lidaram com a pressão imposta sobre eles errando lances fáceis e constantemente tomando decisões equivocadas.
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