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Em ordem cronológica:
1 – a saída de Pablo Marí – o zagueiro espanhol, até então inexpressivo na Europa, acelerou a compactação rubro-negra com seu posicionamento impecável e sua capacidade no jogo aéreo. Tornou-se o pilar da defesa, fundamental para adiantar as linhas defensivas. Sem isso, a tendência a buracos entre setores aumentou.
2 – a parada da pandemia – mesmo tendo voltado aos treinos antes de todo mundo, o tempo de pausa foi suficiente para a equipe “desmemorizar” o que treinara em 2019. Combinando isso com a saída de Marí e a menor potência física, os efeitos puderam ser sentidos ainda na final do Campeonato Carioca.
3 – a folga pós-Carioca – já sem Jorge Jesus (cuja saída comento a seguir) e seu preparador físico, o Flamengo deu outra pausa enquanto o resto dos times treinava. A má forma dos atletas ficou escancarada, a ponto de Gabigol ter ficado mais parecido com seu sósia roliço da torcida. Ficou impossível sequer pensar em ser intenso como em 2019. Seria um festival de lesões e línguas de fora com vinte minutos de jogo.
4 – a despedida de Jorge Jesus – quanto mais peculiares o estilo e as ideias de um profissional, mais complicado é dar seguimento a seu trabalho. Até a Apple sentiu isso. Jorge Jesus não é um Jobs das táticas, mas seu trabalho é bem pouco imitável. Se o time ainda estivesse no pique de 2019 (e do começo de 2020), o sucessor poderia fazer uma mudança bem gradativa para o estilo próprio. Com todo mundo fora de forma, a transformação se tornou medida emergencial.
5 – Bruno Henrique – o grande jogador das Américas, em 2019, já tinha mostrado que uma ausência longa poderia afetar muito seu futebol. Fora assim no Santos, em 2018. Até por isso custou pouco aos cofres do Flamengo. Em 2020, contundiu-se ao marcar um gol pela Recopa. Quando estava voltando, veio a pandemia. Há jogadores que, pela junção entre físico e técnica, sentem muito mais estas pausas. Torrent terá que decidir se escala outros ou mantém sua titularidade, contando com uma melhora no decorrer das partidas. Ninguém sai de má fase sem atuar.
6 – Domènec, nec, nec… – o treinador catalão foi escolhido sob a ideia, perfeitamente razoável, de que o padrão europeu foi um grande sucesso e, assim, deveriam manter o projeto. Contudo, como já escrevi, encontrar um técnico europeu disposto a trabalhar no Brasil, que já não era fácil, ficou ainda pior. Acabaram conseguindo o ex-auxiliar de Guardiola, após trabalho nos Estados Unidos. Os obstáculos principais são:
a – como auxiliar, não tinha que definir planejamentos ou tomar as decisões que afetariam os atletas;
b – tendo que aplicar suas ideias mais rápido do que seria razoável (vide item 3), o desconhecimento do elenco aumenta a tendência a escolhas equivocadas, por tentativa e erro;
c – a mudança de um estilo vertical para um posicional (típica de quem segue Guardiola) é mais aguda e, consequentemente, mais trabalhosa.
7 – rodízio indigesto – Jorge Jesus tinha o princípio de só mexer no time titular por recomendação médica ou fisiológica. O desnível físico do elenco já recomendaria um maior número de alterações, mas parece que Torrent é favorável ao rodízio em qualquer circunstância. Inclusive, imagina-se, para compreender o que cada jogador pode fazer, aproveitando que é início de temporada – sim, tecnicamente não estamos em setembro. Isto vem provocando estranheza geral, o que ganha contornos de irritação quando a escalação naufraga, como no Castelão.
Por estes fatores, é bem improvável que o Flamengo tenha o padrão e o nível de 2019. Contudo, não precisará disso para repetir as conquistas. Na Libertadores, as equipes de fora do Brasil sequer atuaram até agora, desde a paralisação das competições. No Brasil, é questão de mais algumas semanas para estabilizar e, ainda que desprovido de brilho, assumir a ponta com vantagem razoável até o final. Isso, é claro, se os envolvidos não se perderem em meio às dificuldades acima. É tudo contornável para este ano, desde que sem pânico. Os demais clubes e torcedores, obviamente, torcem pelo pânico. Apenas o nivelamento por baixo, como até aqui, pode manter a imprevisibilidade medíocre de outras temporadas.
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